Mais dicas sobre Planejamento Sucessório e Holding Familiar.
Retomando o assunto iniciado na semana anterior, como primeiro passo para abertura de uma sociedade holding familiar, seria imprescindível a elaboração de um contrato social – que recomendamos seja devidamente registrado na JUCESP – dotado de cláusulas contratuais específicas para este tipo de negócio jurídico.
Basicamente, a sociedade holding terá como sócios somente os descendentes de um casal, com as quotas sociais distribuídas proporcionalmente entre os descendentes, respeitada a legítima, ou seja, o que seria devido legalmente aos descendentes na abertura da sucessão pelo falecimento dos seus pais, por exemplo.
Os bens de propriedade do casal – exemplo, imóveis, fazenda com atividade pecuária ou agrária produtiva, empresas lucrativas das mais diversas atividades – com a abertura da sociedade holding, serão doados em vida aos descendentes por meio de cessão de quotas sociais.
Contudo, no contrato social deverá constar cláusula específica que resguarde aos cedentes (patriarca e/ou matriarca) o direito de retomarem este patrimônio, nas hipóteses também previstas no contato social, dentre elas que os sócios cessionários e descendentes (ou donatários) garantam a renda convencionada aos cedentes (ou doadores).
Os cedentes ou doadores, por sua vez, podem ser os próprios administradores da holding controladora, ou, até mesmo, delegarem a administração por procuração pública a terceiros ou a um dos sócios descendentes, com direito a revogação desses poderes a qualquer tempo, a fim de os cedentes e doadores retomarem o controle administrativo e financeiro da sociedade holding.
Vejamos algumas dicas de cláusulas específicas que devem constar no contrato social para abertura de uma sociedade holding familiar, a título de exemplo:
a) doações ou cessões das quotas sociais da empresa holding controladora aos descendentes devem ser gravadas com cláusula de reversão[1] em favor dos doadores e cedentes (patriarca e/ou matriarca), em caso de falecimento de qualquer um dos donatários e cessionários (descendentes), para que se evite que o (a) cônjuge ou companheiro(a) sobrevivente interfira na administração e no andamento da sociedade familiar;
b) instituição de cláusulas de incomunicabilidade, impenhorabilidade, inalienabilidade e usufruto dos imóveis que integram o patrimônio da família, a fim de proteger tais bens de: disputas em divórcio, separação judicial dos descendentes ou de união estável reconhecida judicialmente; dívidas contraídas com terceiros; alienação à terceiros fora do grupo familiar, para assim garantir a renda definida para o sustento vitalício dos doadores ou cedentes, respectivamente;
c) em caso de falecimento de sócio descendente, suas quotas podem ser redistribuídas aos demais sócios remanescentes, em frações iguais, ou retornar aos cedentes originais, a critério destes últimos, devendo-se, na primeira hipótese, fixar-se previamente um valor de indenização aos herdeiros ou sucessores do sócio falecido, sendo vedada a admissão de pessoa estranha ao quadro social da holding, garantindo assim que o patrimônio não saia do grupo familiar;
d) cláusula que preveja que os doadores ou cessionários, em algumas hipóteses, possam alienar o patrimônio que constitui o grupo familiar, com a extinção da sociedade familiar a qualquer momento, indenizando os sócios descendentes por valores pré-definidos, independentemente do valor real da venda dos bens;
e) na hipótese ‘d)’ é necessária uma cláusula expressa que defina previamente o valor que será distribuído aos sócios da holding (descendentes), que poderá ser definido com base no valor nominal das quotas sociais declarado à Receita Federal, ou, até mesmo, pelo valor real de venda, decisão esta que cabe exclusivamente aos controladores da sociedade familiar, no caso os doadores ou cessionários (patriarca e/ou matriarca);
f) em caso de falecimento do administrador, nomear-se-ia um administrador provisório, que poderia ser um administrador profissional ou os próprios cedentes e doadores ou, até mesmo, um dos sócios descendentes, garantindo-se aos demais sócios a distribuição dos lucros e demais frutos da atividade principal, bem como a continuidade da empresa;
g) adesão a um seguro de vida empresarial[2] para caso de falecimento de qualquer sócio descendentes, visto ser esse mecanismo uma forma importante de não descapitalizar a empresa, permitindo que os sócios sobreviventes tenham capital suficiente para dar continuidade às atividades principais geridas e controladas pela holding e que mantém o sustento da família. A renda de um patrimônio imobiliário ou o produto de uma venda de imóvel pode ser destinado para pagar seguro em favor de determinado beneficiário, a título de sugestão;
h) instituição da cláusula de call option – essa cláusula confere um direito de arrependimento aos cedentes e usufrutuários da holding (matriarca e/ou patriarca), permitindo que possam alienar o patrimônio e/ou a própria sociedade, caso se frustrem com a holding ou recebam proposta de terceiro para aquisição das quotas sociais da sociedade.
Esses primeiros artigos foram uma introdução sobre o tema, acompanhada de alguns apontamentos e considerações sobre a holding familiar e constituição de uma sociedade empresária com cláusulas específicas.
Na semana vindoura, retomaremos o assunto, para falarmos sobre sociedades controladora e controlada, além de dar mais dicas sobre planejamento sucessório e gestão de holding familiar.
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[1] Cláusula de reversão: se aplica para doação – caso o donatário faleça antes do doador, o bem doado retorna ao doador, para evitar que o bem doado seja sucedido pelo cônjuge ou filhos do donatário. Não é possível a reversão em favor de terceiro (artigo 547, parágrafo único, do CC). Haveria também a possibilidade de instituição de encargo à doação (e.g. para cumprimento das obrigações sociais), cuja inobservância implicaria em revogação da doação, muito comum em testamentos. Mas atenção: a viabilidade de impor encargo em doação depende da anuência do donatário.
[2] O artigo 794 do Código Civil diz que o seguro de vida não pode ser inventariado, razão pela qual é considerado uma forma recomendável de planejamento sucessório e tributário, pois não incide imposto e o valor segurado não pode ser usado para pagar dívidas deixadas pelo falecido.